sexta-feira, 29 de julho de 2016

Travessia de caiaque da Represa da Serra do Facão - GO


Viajando de carro de Brasília para Belo Horizonte, pela BR - 040, cruza-se a divisa de Goiás e Minas Gerais pelo rio São Marcos. Antigamente, quando passava por esta ponte, eu avistava o rio de águas azul-turquesa e mata ciliar exuberante e imaginava fazer uma viagem de caiaque por aquele belo curso sinuoso.
Muitos anos após minha primeira passagem pela divisa, consegui executar uma remada pelo límpido rio São Marcos. Planejei um percurso de 85 quilômetros saindo das proximidades da cidade de Campo Alegre de Goiás e tendo como destino a recém construída represa da Serra do Facão. Nesta viagem, me acompanhou o amigo de expedições Luis Hashimura.
A cansativa logística da expedição iniciou-se às 04h00min de sábado (23/07/2016), quando saímos de Brasília bem conduzidos pelo Seu Dagô (meu pai e resgate oficial). Seguindo as coordenadas do ponto de partida, chegamos às 11h30min ao Ribeirão Ponte alta, um riacho com 10 metros de largura, pelo  qual deslizaríamos nossos caiaques até desaguar no rio São Marcos.
Zarpamos às 12h50min, sobrepondo galhos e toras deixados pelas chuvas. Dez quilômetros remados e algumas pequenas corredeiras transpostas, chegamos à confluência com o rio São Marcos, onde foi possível visualizar uma faixa de mata ciliar às margens do rio totalmente morta. Tal fato, causado pelo alagamento das áreas atingidas pela represa, demonstra o grande impacto causado por sua construção. A lógica é simples: sem vegetação, sem sombra, sem fauna.   



Remamos o dia todo sob um um forte calor, apesar de estarmos no inverno!
Paramos por volta de 17h30min, ao encontrarmos um bom local para acampar (bom local= terreno plano e seco).



Montamos as barracas e quando preparávamos o jantar (macarrão com atum), um pequeno barco se aproximou e nos indagou o que fazíamos ali. Expliquei que estávamos descendo o rio São Marcos até a represa. No barco, havia um grupo de japoneses que pescava pela região. Após alguns minutos de conversa, o grupo se despediu deixando conosco três suculentos peixes para serem assados em nossa fogueira. Agradável surpresa!


Antes de dormir, enquanto admirava o impressionante céu estrelado, vi a estrela cadente mais duradoura que já testemunhei. Enquanto o meteoro deslizava pelo céu, ainda tive tempo de alertar o Luis para que olhasse. Minutos depois, a lua nasceu laranja, refletindo no espelho d'água sua cor dourada. Após o deleite, dormi como uma criança.
No dia seguinte, saímos às 09h50min, tendo como apoio um bom vento de popa. O rio foi lentamente se alargando, sinal de que adentrávamos na parte represada do rio São Marcos. Com o vento correndo solto pela grande área aberta (sem obstáculos) a superfície da represa ficou mexida, apimentando um pouco nossa remada. 
Durante o segundo dia, o Luis avistou uma cobra nadando e eu presenciei uma ariranha entocada em uma das árvores secas da margem, além das inúmeras capivaras. Fizemos duas paradas para lanchar. 


Aproximadamente às 17h00min, cruzamos uma grande ponte no meio da represa. Logo na sequência, finalizamos o dia acampando em uma ilha. Antes de dormir fui checar o casco de meu caiaque, quando avistei uma bela cobra coral bem acomodada sob meu barco. Tal fato nos fez ficar mais atentos com os recipientes abertos nos caiaques. 

Como havíamos remado bastante no segundo dia, restava-nos apenas 17 quilômetros para o destino final. Remamos "fofocando" tranquilos até a barragem, local onde eu havia combinado com meu pai para nos encontrar às 16h00min. 
Aproximando da barragem, nos deparamos com algumas placas de advertência e boias delimitadoras, o que significava que não poderíamos aportar no local planejado para o resgate. Sem ter como alterar o ponto de encontro com nosso resgate, apelamos para o velho "João sem braço" e seguimos remando, meio que escondidos colados à uma das margens, até o local onde eu havia préestabelecido. Ocorre que o ponto se encontrava dentro da área de segurança da usina hidrelétrica. 


Tiramos os caiaques da água e, enquanto o Luis se encarregou de tomar conta dos barcos, eu fiquei com a "responsa" de negociar o acesso de nosso resgate à usina. Antes mesmo de chegar na pista da usina, um carro veio ao meu encontro. O segurança logo perguntou o que eu fazia ali e que minha presença não era permitida. Expliquei que havíamos terminado a travessia da represa e que precisávamos encontrar com nosso resgate. O segurança, utilizando-se de seu "micro poder", foi enfático:
- Vocês devem sair daqui já. E terão que carregar os caiaques. 
Sem saber como convencê-lo de que não tínhamos como carregar os barcos por quase dois quilômetros até o portão de entrada, acabei inventando uma "pequena" história e blefei:
- Olha senhor, entendo que estamos errados, mas não temos como retornar para a água. Nossa comida acabou, não temos como remar para outro local e encontrar o resgate, pois não tenho como avisá-lo, mas se você puder me emprestar um telefone, posso entrar em contato com o "Sr. Godofredo Ribas", diretor de assuntos expedicionários em locais não permitidos, e pedir a ele uma autorização para meu resgate me pegar aqui dentro.
Meio sem jeito, o segurança coçou a garganta e mudou o tom de voz:
- Bem, vou facilitar as coisa para vocês. Não vai ser preciso fazer a ligação. Mas fiquem sabendo que "não pode".
Às 15h30min, o Seu Dagô se aproximava do portão da usina. Amarramos os caiaques no carro, e, já em direção a Brasília, dávamos risadas do ocorrido no final de nossa remada. 

"Mas você é o que faz, não o que diz".
Yvon Chouinard 

1º dia - 23/07/2016
Distância: 25 km
Tempo: 3h43'
Média: 6,8 km/h

2º dia - 24/07/2016
Distância: 43 km
Tempo: 6h20'
Média: 6,9 km/h 

3º dia - 25/07/2016
Distância: 17 km
Tempo: 2h27'
Média: 6,9 km/h