Bolivia - 2013 Tarija e Huyana Potosi
Montanhas: Tarija e Huyana Potosi
Local: Bolívia
Duração: 9 dias (5 a 14 de junho)
Integrantes:
Alexandre Ferreira
Alexandre Manzan
Luis Hashimura
Roberto Ribas Junior
Há algum tempo, meu amigo Alexandre Ferreira havia me
convidado para subirmos uma montanha juntos. Quando ele propôs escalarmos o
Huyana Potosi, aceitei imediatamente,
pois, além da boa companhia, poderia “ticar” uma montanha na Bolívia. No decorrer dos preparativos para a viagem, mais dois
amigos aderiram à expedição: Luis Hashimura, com quem eu já havia escalado na
Antartica, e Roberto Junior, parceiro de treinos e montanhas do Alexandre em
Curitiba.
Passamos um mês nos comunicando por e-mail a fim de
organizar os detalhes. Nosso plano era passar alguns dias em La Paz para nos
aclimatarmos, seguir para o Pequeno Alpamayo (5340 m), e por fim, tentarmos
subir o Huyana Potosi (6088 m). Para tanto, eu, Luis, Alexandre e Júnior
desembarcamos em La Paz no dia 5 de junho (dia em que eu completei 39
primaveras!).
Do avião pudemos avistar o que nos esperava: o imponente e
belo Potosi com seus 6088 metros acima do nível do mar. Ficamos três dias na
cidade, tempo suficiente para organizarmos os últimos detalhes, comprarmos os
víveres necessários e iniciarmos nosso processo de aclimatação.
De La Paz, no dia 08 de junho, rumamos para o lago Tuni,
de onde iniciamos a aproximação para o acampamento base do Pequeno Alpamayo.
Por estarmos em “estilo alpino”, subimos de 4300 metros até 4700 abarrotados de
equipamentos e comida. Minha mochila devia estar pesando cerca de 25 quilos.
Diante disso, ao chegarmos ao local do acampamento base, estávamos todos
exaustos e com dor de cabeça. Sentimos que nossa aclimatação levaria mais tempo
que o previsto.
No dia seguinte, após uma fria noite de 4º C, optamos por
descansar mais um dia nessa altitude. Com tempo bom, pudemos apreciar a beleza
do lago Chiar Kota com o anfiteatro natural formado pelas montanhas Condoriri,
Pequeno Alpamayo e Tarija.
Ao final do dia 9 de junho, o tempo começou a mudar e uma
boa camada de neve mudou a paisagem do dia anterior. Planejamos o início de
nossa ascensão para às 03:00hs do dia seguinte, visto que havíamos calculado
nossa ascensão com base em informações de um guia que se encontrava no local.
Contudo, essas informações mostraram-se infundadas durante nossa escalada,
pois, à medida que amanhecia, percebíamos que a previsão de tempo até o cume
seria bem maior.
Afora saber que perderíamos nosso transporte de volta para
La paz por conta do atraso, nossa ascensão foi espetacular. O Alexandre e o
Junior, debutantes na escalada em gelo, estavam extasiados com as primeiras
imagens da montanha com o clarear do dia. Não à toa! Iniciamos nossa subida às
03:00hs, sem nenhuma luz.
A transição da madrugada para o dia em uma montanha
coberta com neve produz um dos mais belos espetáculos naturais; o breu torna-se
vagarosamente em um vulto rosado de rochas e neve até que, sem perceber, uma
atmosfera de realidade invade a paisagem, momento em que nos sentimos a menor
partícula do universo. Talvez seja este momento o principal motivo de sempre
voltarmos para o “perrengue” da montanha.
Aos 5300 metros, alcançamos o cume do Tarija, montanha que
dá acesso à crista do Pequeno Alpamayo. Porém, devido à avançada hora em que
pisamos o Tarija, decidimos dar meia volta a fim de conseguirmos um transporte
de volta para La Paz no mesmo dia.
O curto período estipulado para esta ascensão nos custou
um preço alto. Ao chegar em “Rinconada” para pegarmos a condução para La Paz,
estávamos todos muito cansados e abatidos, confirmando, desta forma, que
precisaríamos de mais tempo para escalar o Huyana Potosi.
De volta a La Paz (3700 m), descansamos dois dias nos
alimentando bem a fim de tentar subir o Potosi. Contudo, o tempo não estava
bom, chovendo bastante na cidade e nevando muito na região da montanha. Com
esse cenário, Alexandre e Junior decidiram antecipar suas voltas ao Brasil,
pois se sentiram satisfeitos com nossa primeira ascensão no Tarija. Sábios
amigos! Apesar de não saberem, acabaram se livrando de uma “roubada” enorme no
Potosi, como eu e o Luis pudemos constatar mais tarde.
Dia 12 de junho, fomos, eu e o Luis, para o acampamento
base do Potosi (4700 m), de onde subimos direto para o acampamento Piedras
(5130 m). Deste ponto, planejamos fazer o ataque ao cume.
Já durante esta ascensão,
percebemos a roubada em que estávamos prestes a entrar; uma nevasca de dois
dias sem parar e um frio de 0º C com sensação térmica de – 10º C nos davam as
boas vindas enquanto negociávamos nossos passos pela neve até os joelhos. Os
tombos e tropeções foram inevitáveis!
Após 2h30’, chegamos ao refúgio. Lá, conseguimos dois
beliches em meio ao “crowd”, tomamos uma sopa quente para nos refazer do frio e
descansamos enquanto observávamos a continuidade da nevasca que açoitava o
vitral do refúgio.
No início da noite, conversei sobre as condições do tempo com
alguns guias que estavam no local a fim de levar clientes ao cume na madrugada
seguinte. Em meio a análises e ponderações, decidimos, eu e o Luis, realizar o
ataque ao cume do Potosi tendo no visual ao menos um guia local, visto que eu
não quis confiar cegamente em meu GPS naquela temperatura e altitude (alguns
dias antes o bendito havia me deixado na mão em meio à ascensão ao Tarija).
Às 02:00hs do dia 13 de junho, iniciamos nosso ataque após
um breve desjejum. Além da escuridão, a nevasca não permitia avistar nada a
mais de 40 metros a nossa frente. Desta forma, fomos subindo seguindo o
tracklog do GPS e confirmando a rota com algumas pegadas deixadas pelo grupo a
nossa frente. Mas, por vezes, as pegadas se apagavam com o rápido acúmulo da
neve que caía.
A temperatura beirava os -2ºC quando atingimos o primeiro
lance técnico da subida; uma encosta de 45 metros com 70 º de inclinação que
nos obrigou a usar os dois piolets. Durante esta passagem, as mãos ficaram
constantemente em contato com a neve, pois é necessário segurar firmemente os
piolets a fim de se manter fixo à parede. Com isso, ao final da parede, meus
dedos estavam duros, doloridos e quase congelados, tendo que massageá-los por
um tempo a fim de forçar a circulação sanguínea nas pontas dos mesmos.
Já com o dia amanhecendo, e sem previsão de melhora do
tempo, alcançamos a cota de 6000 metros. Sem enxergar nada além de 50 metros de
distância, chegamos ao “crux” da montanha, uma aresta de aproximadamente 100
metros de comprimento, na qual se tem um abismo de 1 km do lado oeste e uma
rampa de 600 metros com 85º de inclinação do lado leste. O problema é
atravessar esta aresta de 35 cm de largura com ventos fortes, pois este ponto
fica a 6040 metros de altitude, local mais exposto da montanha.
O Luis guiou esse trecho até a metade da aresta, onde
avistei o guia do grupo que estava na frente. Neste momento, analisei a
situação em que eu e o Luis nos encontrávamos: era 07:30hs, a nevasca começava
a piorar com fortes pancadas de vento, não enxergávamos quase nada, levaríamos
mais 40 minutos até o cume e estávamos congelando os dedos. Minha decisão veio
quando cogitei a possibilidade de uma pane em meu GPS. Não conhecia a montanha,
não tinha referências visuais devido à nevasca e estava já exausto e
debilitado.
Decidi descer e acompanhar o guia que seguia aresta
abaixo. Durante as 4 horas que levamos para chegar ao refúgio (5130 m), pensei
em minha acertada decisão em voltar. Juntos, batemos cabeça para achar o
caminho de volta em meio à neve. Um dos clientes do grupo que acompanhávamos desabou
várias vezes de exaustão e frio. Prometi um monte de coisas a fim de chegar
logo ao refúgio. Chegando próximo ao local, só avistamos o refúgio a 20 metros
da porta.
Lá dentro, com a temperatura mais agradável, tomamos uma
sopa quente, entramos em nossos sacos de dormir e cochilamos por 30 minutos.
Apesar do mau tempo, tínhamos que descer para La Paz no mesmo dia, pois na
manhã seguinte pegaríamos o voo para o Brasil.
Na tradicional correria, descemos para o acampamento base,
de lá pegamos uma condução para La Paz, onde, após arrumar as tralhas, tomamos
uma cerveja típica (Paceña) para comemorarmos o fim da empreitada. No dia
seguinte, para “selar” a sequência de roubadas, nosso voo atrasou quatro horas
devido ao mesmo mau tempo que havíamos sentido na pele a 6000 metros de
altitude.
Pouco antes de embarcar, em um breve instante em que as
nuvens se dissiparam um pouco, pude ver o cume do Huyana Potosi. Durante toda a
escalada, não avistamos quase nenhuma parte da montanha. Fizemos uma escalada “às
cegas”.
Sobrevoando a Cordilheira dos Andes durante a volta para
casa, avistei centenas de cumes à espera de montanhistas. No avião, refleti
sobre minha viagem prestes a acabar. Das duas montanhas que planejamos escalar,
ficamos a meros 50 metros verticais de seus cumes. Mas qual é o verdadeiro
sentido de tentar chegar ao topo das montanhas? Do assento 19 A do voo de volta
ao Brasil, concluí que o sentido está no processo: nos detalhes dos atos
preparatórios, na vontade de estar com bons camaradas em plena autossuficiência,
em cada metro conquistado em meio às dificuldades e frio, enfim, o verdadeiro
sentido está na parte que precede o cume!
Agradecimentos:
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